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 Esquema com operadora de telefonia no RS pode ter envolvido mais de 30 advogados
16 de Maio, 2017

Esquema com operadora de telefonia no RS pode ter envolvido mais de 30 advogados

 

Um suposto esquema entre advogados para prejudicar clientes em processos movidos contra uma operadora de telefonia pode ter movimentado R$ 5 bilhões. Mais de 30 advogados gaúchos podem estar envolvidos, e há indícios e provas de que pelo menos sete deles receberam dinheiro da Oi para fazer acordos ou desistir das ações, à revelia das vítimas. O suposto esquema foi revelado nesta segunda-feira (15) pelo Jornal do Almoço, da RBS TV. Entre os investigados, estão ex-integrantes do Judiciário e do Ministério Público. Dois deles tinham uma ligação com o escritório de Maurício Dal’Agnol, de Passo Fundo, já indiciado por supostamente ter recebido R$ 50 milhões da operadora para prejudicar mais de 5 mil clientes.

A descoberta de um documento apreendido na casa de Dal'Agnol, em Passo Fundo, pode aumentar o número de advogados investigados. Obtida pelo RBS Notícias, a lista relaciona 20 escritórios que mantêm ações na Justiça contra a antiga CRT. Ao lado dos nomes, constaram valores e quantidade de processos. O documento será encaminhado ao Ministério Público, para investigação.

"A partir do conhecimento dessas investigações levadas pelo MP [em Taquara e Porto Alegre], estamos agora encaminhando essa lista porque é importante que se investiguem todos esses fatos. Aqui tem quantidade de valor absurdo [em ações] e merece atenção especial nesses advogados constando nessa lista", disse o delegado Mauro Vinícius Soares de Morares, chefe da Delegacia da PF em Passo Fundo.

 

Operação em Taquara

Na semana passada, a Promotoria Especializada Criminal realizou uma operação, até então mantida sob sigilo, na qual cumpriu buscas nos escritórios e residências de dois advogados de Taquara. Evandro Montemezzo e Flávio Carniel são suspeitos de receber R$ 15 milhões da Oi para desistir de ações nas quais buscavam valores em nome de clientes, referentes a ações da antiga CRT.

"Esses processos já estavam em várias fases, alguns deles em fase quase de pagamento da empresa de telefonia para as pessoas. Como em um passe de mágica, a partir do contato dos advogados da empresa de telefonia, os advogados [dos clientes] renunciavam ao direito dessas pessoas traindo a confiança que eles deveriam ter para com as pessoas que representavam", explica o promotor Flávio Duarte, responsável pela investigação.

Sem saber dos acordos, alguns clientes não receberam nada, e outros, pequenas quantias. Caso de uma funcionária pública de Taquara, que prefere não ser identificada. Ela recebeu apenas R$ 1,4 mil e desconfiou. Acabou descobrindo no Fórum que a indenização era muito maior: R$ 270 mil.

"Fiquei chocada porque fui lesada duas vezes: uma pelo direito que eu tinha pela Brasil Telecom e outra por um profissional que eu contratei", reclama a funcionária pública.

 

Advogado da capital faria 'acerto'

O dinheiro recebido por Montemezzo e Carniel para desistir das ações teria sido entregue pelo advogado e procurador de Justiça aposentado Ricardo de Oliveira Silva, contratado pela Oi para realizar o "acerto".

"A partir da quebra do sigilo bancário, se constatou pagamentos de valores da operadora de telefonia para o escritório de advocacia que representava essa operadora em Porto Alegre e, depois, o imediato repasse desses valores para sociedades de advogados das quais esses dois advogados investigados faziam parte", explica o promotor.

O escritório do advogado contratado pela Oi, em Porto Alegre, também foi alvo de buscas. Silva, que chegou a concorrer ao cargo de chefe do Ministério Público, teve bens bloqueados para garantir eventual ressarcimento às vítimas. Ele também é investigado na Polícia Federal de Passo Fundo. A suspeita é de que tenha repassado dinheiro a outros dois colegas para que eles realizassem acordos judiciais prejudicando os clientes, como no caso de Taquara.

 

De R$ 12 milhões para R$ 15 mil

O delegado Mário Vieira diz que Roger Maurício Bellé, de Bento Gonçalves, e Cassio Viegas de Oliveira, de Montenegro, representavam vítimas que tinham direito a mais de R$ 60 milhões. Em um dos processos, R$ 12 milhões seriam destinados a cinco clientes. Em vez de dividir o total, cada um teria recebido apenas R$ 15 mil. Em depoimento, uma das vítimas disse que desconhecia o acordo, e que esperava receber o valor integral.

"Um escritório acordava com o outro para desistir do processo e, obviamente, pela investigação que nós estamos levando a cabo, 40% a Brasil Telecom (adquirida pela Oi) pagava por fora e não por dentro do processo em acordo judicial", observa o delegado. Segundo ele, os dois advogados eram ligados ao escritório de Maurício Dal’Agnol.

Em Santa Cruz do Sul, três advogados foram denunciados pelo mesmo motivo. Entre eles, o desembargador aposentado do Tribunal de Justiça Moacir Haeser. Ele e os colegas Augustinho Teloken e João Pedro Weide também teriam feito acordos que prejudicaram os próprios clientes. No processo em que uma aposentada e outras quatro pessoas teriam direito a receber R$ 525 mil, o valor caiu para R$ 262 mil.

"As pessoas acabam desacreditando em tudo, a gente fica sem ter o que dizer. Não dá para confiar em nada, a gente confia e leva o golpe", diz o catador Paulo Ubirajara de Moura, filho da aposentada.

 

OAB promete investigação e punição

Em Porto Alegre, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Sul, Ricardo Breier, prometeu investigar as denúncias e punir eventuais desvios de conduta de advogados. "A OAB vai apurar, vai determinar através de ofício, se chegar assim, ao nosso tribunal de ética e disciplina, pra que apure se houve ou não houve transgressão daquilo que nos mais zelamos, que é o código de ética e disciplina."

O presidente da OAB-RS orienta os consumidores que entraram na Justiça a examinar as ações diretamente nos fóruns ou que contratarem advogados de confiança para revisar os processos.

Foi o que fez a bancária Fátima Teixeira, de Novo Hamburgo. Ela teria direito a receber 223 mil reais em ações da antiga CRT.

Sem que soubesse, o advogado Maurício Dallagnol fez um acordo com a Oi, reduzindo a dívida para R$ 111 mil. Desse total, recebeu apenas R$ 20 mil. Ela, então, contratou uma defensora, para buscar na Justiça o valor ao qual tem direito. Obteve ganho de causa, com um detalhe: sobre a quantia desviada, o juiz mandou descontar 30% a título de honorários a serem repassados ao advogado.

 

Contrapontos

A Oi, que comprou a Brasil Telecom, esclareceu por meio de nota (leia na íntegra abaixo) que, até o momento, a empresa não é objeto da investigação mencionada pela reportagem e que o fato é restrito a prestadores de serviços jurídicos à empresa, mas se colocou à disposição para prestar eventuais esclarecimentos para contribuir com as apurações.

Os advogados Augostinho Teloken e João Pedro Weide disseram que todos os acordos realizados foram benéficos aos clientes e que todos eles receberam o dinheiro a que tinham direito.

Já o advogado Moacir Haeser considera a denúncia uma injustiça e que os acordos foram feito com base em decisões de instâncias superiores de Justiça.

Os advogados Evandro Montemezzo e Ricardo de Oliveira Silva não retornaram os pedidos de entrevista.

O advogado Flávio Carniel nega envolvimento no caso e diz que todos os pagamentos feitos aos clientes ocorreram dentro da lei.

A defesa de Roger Maurício Bellé nega a acusação e diz que o advogado era apenas um parceiro de Maurício Dal'Agnol, que era quem sacava os valores e entregava os cheques para Roger distribuir aos clientes.

Já o advogado Cássio Viegas de Oliveira declarou que não vai se manifestar porque não foi comunicado da investigação. 

 

Matéria: G1 - RS

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